Com apoio da CVM, mercado de capitais é alternativa estratégica para o agronegócio

Com a ampliação de produtos financeiros do agronegócio, as sementes plantadas pela CVM começam a ser colhidas

João Pedro Nascimento

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O agronegócio brasileiro é um dos pilares da economia nacional, representando aproximadamente 25% do PIB em 2024, segundo dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). O setor movimentou R$ 2,72 trilhões apenas em 2024 e tem sido um dos principais motores do crescimento econômico do país, com destaque no volume de exportações e na geração de empregos diretos e indiretos. No entanto, a participação do agronegócio no Mercado de Capitais sempre foi historicamente sub-representada, correspondendo a 3,5% do total de ativos financeiros vinculados ao setor. Há, portanto, um nicho próspero de oportunidades a ser melhor explorado. É nesse contexto que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem atuado de forma estratégica para aproximar o agronegócio do sistema financeiro. 

Com a força simbólica do trocadilho, a CVM intensificou o plantio das sementes do agronegócio no Mercado de Capitais a partir de 2022, com a criação de uma área técnica específica para o setor e o lançamento do Boletim CVM Agronegócio. Além disso, editou a Resolução CVM nº 214, que consolida a regulação definitiva dos FIAGROs, integrada ao Marco Regulatório dos Fundos de Investimento (Resolução CVM nº 175), como Anexo VI. A Autarquia também adotou medidas regulatórias voltadas à ampliação da atratividade do Mercado de Capitais para os agentes do agronegócio, como a Resolução CVM nº 194 e o estímulo ao mercado de securitização. Como resultado, os frutos começaram a ser colhidos: apenas os FIAGROs registraram crescimento de 315% em dois anos. 

Tradicionalmente, o financiamento do agronegócio baseou-se no crédito rural oficial, com destaque para o Plano Safra e outras linhas subsidiadas pelo setor público. Esses modelos foram fundamentais durante décadas para o sucesso do agro brasileiro. Contudo, diante da expansão do setor e da crescente integração global do Brasil como fornecedor de cadeias agroindustriais, o modelo tradicional passou a revelar limitações. Em um cenário de juros elevados e maior necessidade de responsabilidade fiscal, torna-se cada vez mais evidente que as linhas públicas de crédito precisam ser complementadas por alternativas mais modernas de captação de recursos. 

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Nesse contexto, o Mercado de Capitais surge como alternativa sólida e estratégica para suprir as necessidades financeiras do agronegócio. Muitos produtores, que antes dependiam exclusivamente de crédito bancário ou de fornecedores, enfrentam limitações como garantias exigidas, juros elevados e limites de crédito reduzidos. O Mercado de Capitais, por sua vez, permite o acesso direto ao investidor, com mais transparência, concorrência e eficiência. 

Instrumentos como os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e a Cédula de Produto Rural Verde (CPR Verde) têm sido fundamentais nessa transição. Os CRAs, lastreados em recebíveis do setor agropecuário, cresceram 60% entre 2022 e 2024, atingindo R$ 153,5 bilhões em circulação. Já a CPR Verde, introduzida em 2021, possibilita o financiamento sustentável ao premiar produtores pela adoção de práticas ambientais responsáveis. 

Desde sua criação pela Lei nº 14.130, os FIAGROs tornaram-se o carro-chefe da presença do agronegócio no Mercado de Capitais. A regulação passou de um estágio experimental (Resolução CVM nº 39) para o estágio atual, com a Resolução CVM nº 214. Os avanços mais relevantes incluem: 

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A inserção do agronegócio no Mercado de Capitais gera benefícios sistêmicos: 

Mais recentemente, a CVM anunciou a flexibilização das regras para que cooperativas agrícolas possam estruturar seus próprios FIAGROs. Com essa inovação, cooperados, fornecedores e funcionários poderão investir nesses fundos, e as cooperativas poderão centralizar operações de emissão, armazenamento e comercialização. Essa medida aumenta a previsibilidade de recursos e amplia o acesso dos cooperados ao financiamento estruturado. 

Nesse cenário, o papel da CVM tem sido central: promover inovação, ampliar o acesso, garantir segurança jurídica e aproximar investidores e produtores, sempre com foco na proteção do investidor e no desenvolvimento do Mercado de Capitais. 

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Integrar o agronegócio ao Mercado de Capitais vai além de uma evolução regulatória — é uma estratégia de transformação nacional. Essa aproximação fortalece o setor agropecuário, dinamiza o mercado financeiro e contribui diretamente para o desenvolvimento sustentável do país. O Brasil, com sua vocação agrícola e liderança ambiental, tem a oportunidade histórica de unir produtividade e responsabilidade, consolidando-se como referência global em finanças sustentáveis e inovação no campo. 

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João Pedro Nascimento

João Pedro Nascimento é Presidente da CVM e Professor da FGV Direito Rio. Doutor e Mestre em Direito Comercial pela USP, Pós-Graduado em Direito Empresarial, com concentração em Direito Societário e Mercado de Capitais, pela FGV Direito Rio, com Cursos de Extensão pela Harvard Law School. Atualmente, João Pedro é Membro do Board da IOSCO, do Bureau de Governança Corporativa da OCDE e do Steering Committee do FSB.

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