Entenda suspensão de ação contra Ramagem e pode beneficiar Bolsonaro

Decisão da Câmara impede avanço de processo e reforça proteção a aliados do ex-presidente

Marina Verenicz

Brasilia DF 28 04 2020=Alexandre Ramagem, que exercia o cargo de diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), é graduado em direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Ingressou na Polícia Federal (PF) em 2005 e atualmente é delegado de classe especial. Sua primeira lotação foi na Superintendência Regional da PF no estado de Roraima.foto Valter Campanato/Agência Brasil
Brasilia DF 28 04 2020=Alexandre Ramagem, que exercia o cargo de diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), é graduado em direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Ingressou na Polícia Federal (PF) em 2005 e atualmente é delegado de classe especial. Sua primeira lotação foi na Superintendência Regional da PF no estado de Roraima.foto Valter Campanato/Agência Brasil

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A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (7), por 315 votos a 143, um projeto do PL que suspende a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), réu no caso da trama golpista que supostamente tentou impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O texto, porém, vai além: abre brecha para atingir todo o processo relativo à tentativa de golpe em 2022, o que poderia beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros envolvidos.

A proposta foi inicialmente aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, com relatório do deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), que inseriu uma cláusula permitindo a suspensão do processo “em sua integralidade”. Isso significa que o andamento da ação penal ficaria interrompido, sem especificar apenas o caso de Ramagem, o que poderia beneficiar Bolsonaro e outros réus.

O relatório foi aprovado na CCJ por 44 votos a 18. No plenário da Casa, a decisão foi confirmada com 315 votos favoráveis e 143 contrários. A medida tem efeito imediato, sem necessidade de passar pelo Senado.

A aprovação gerou reação imediata no Supremo Tribunal Federal (STF). O presidente da Primeira Turma da Corte, Cristiano Zanin, já havia alertado a Câmara sobre as limitações de sua competência para sustar ações penais. Segundo especialistas, a medida deve ser considerada inconstitucional pela Corte.

Segundo o entendimento anterior do STF, a Câmara só tem competência para suspender ações penais envolvendo crimes cometidos por parlamentares após a diplomação. No caso de Ramagem, isso limitaria a suspensão apenas aos crimes de dano qualificado ao patrimônio e deterioração do patrimônio tombado. No entanto, os outros crimes pelos quais Ramagem é acusado — associação criminosa armada, golpe de Estado e abolição do Estado democrático de direito — teriam ocorrido antes da diplomação.

Diante da movimentação da oposição como forma de ajudar Bolsonaro, a base do governo já se prepara para contestar a aprovação do relatório de Alfredo Gaspar. O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), classificou a medida como uma “nova versão da anistia” e afirmou que os governistas vão questionar a legalidade da decisão.

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Para Farias, o Legislativo não tem poder para determinar o trancamento de todo o processo, atingindo todos os réus. “É melhor a Câmara não entrar nessa aventura”, disse o deputado, prevendo que o STF será provocado e deverá invalidar a medida.

Um novo embate entre Poderes

A aprovação do projeto marca um novo capítulo de tensão entre os Poderes. Em ofício enviado ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), há duas semanas, o ministro Zanin havia deixado claro que o Legislativo só poderia suspender ações penais relacionadas a crimes cometidos por deputados após a diplomação.

A decisão da Câmara, no entanto, ignora essa orientação e expande a suspensão para todo o processo, incluindo réus que não são parlamentares e crimes que teriam ocorrido antes da posse dos deputados.

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Para críticos, a aprovação do projeto é uma tentativa de criar um precedente que poderia beneficiar outros políticos investigados, incluindo o próprio Bolsonaro. O caso de Ramagem é visto como uma primeira tentativa de testar essa estratégia, mas o impacto pode ser muito maior se a medida não for derrubada pelo STF.

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